Edilson Parra
[junho de 2019]
Ao intitular esta exposição individual por “Sapiens”, o artista Edilson Parra inevitavelmente nos leva a essas duas palavras que tanto escutamos em nossa vida escolar: homo sapiens. Em latim, a designação científica da espécie humana pode ser traduzida como “o homem que sabe”. Mas como falar em sapiência num momento da história em que a barbárie é, mais do que notada, ostentada por muitos desses humanos que supostamente “sabem” de algo?
Parte dos trabalhos aqui reunidos dá prosseguimento às suas séries baseadas na apropriação e criação de tridimensionalidades. Partindo da noção de armadilha para fazer objetos de diferentes escalas e feitos pelo encontro de materiais naturais e industriais, Parra tem parte de seu olhar pautado em uma reflexão em torno da escultura. O encontro entre o metal e a madeira, assim como peças feitas em plástico, resina, couro e mesmo com galhos de árvore, gera imagens formalmente potentes que instigam o olhar evitando qualquer mensagem literal. A noção de colagem – tão cara à história da arte – é um ponto norteador dessa série.
Por outro lado, há um aspecto de suas novas pesquisas que gira em torno da utilização de palavras e símbolos de amplo reconhecimento cultural. Na série “Ícones da pré-história virtual”, a escala pequena do objeto é latente e a superfície das pedras é usada para ser a base de formas feitas em baixo-relevo. Imagens associadas ao ato de compartilhamento e à localização por GPS se transformam ficcionalmente em glifos. A relação entre as tecnologias digitais e a certeza de sua obsolescência futura estão diretamente relacionadas nessa espécie de arqueologia do futuro.
Outras iconografias usadas pelo artista giram em torno da identidade nacional no Brasil. Bandeiras pintadas em aquarela tem sua imagem anteposta pelos nomes de líderes do MST assassinados recentemente no estado da Paraíba. Antes de qualquer desejo positivista de ordem e progresso, não podemos nos esquecer que as histórias do Brasil tem a violência como elemento fundador – as recentes ondas elogiosas ao período brutal da ditadura militar no país são apenas um dos diversos exemplos disso. Deveríamos dar prosseguimento a uma reflexão crítica e que sempre revisita as narrativas em torno do país ou, como diz uma gíria recente, estamos fadados a “passar pano” nos coturnos da violência militar?
A resposta cabe a cada um, mas parece que a exposição sugere um encaminhamento para a questão a partir de um de seus trabalhos: “Luto”, diz em letras garrafais uma gigante faixa. A palavra pode se referir tanto ao verbo, quanto ao substantivo. A resposta de Edilson Parra parece mais voltada à ação – esse ato de lutar no campo das artes visuais pode se dar tanto pela literalidade, quanto pelo mistério das imagens. O artista parece escolher, felizmente, ambas as vias, cada uma em seu tempo.
(texto relativo à exposição “Sapiens”, de Edilson Parra, no Centro Cultural Banco do Nordeste, em Sousa, 2019)