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Imitation of life


Jonas Arrabal
[03 de fevereiro de 2015]




Parece que foi há cinco anos, mas foi ali em 2013, na Casamata, aqui no Rio de Janeiro, que vi a primeira individual do Jonas. Azulejos, um pedaço de terra no chão com sal grosso, um texto escrito pelo próprio e um vídeo. O espaço expositivo era pequeno, mas a vontade de sair de qualquer lugar seguro era grande. Lembro de não me envolver muito com o conjunto das obras, mas ficar contente pela assimetria da proposição. Não era uma primeira exposição individual onde o espectador apreendia de modo claro (às vezes tal qual um cartão de visita) as opções de linguagem e semântica por parte do jovem artista - e isso por si só, naquele momento, me parecia algo potente.

De lá para cá tive a oportunidade não só de trabalhar com Jonas em três exposições, mas de ver de perto o seu modus operandi como indivíduo. Diferente de ser um colega profissional, Jonas se tornou um dos meus vizinhos mais queridos e alguém a quem recorro diariamente, seja para me ajudar a tomar decisões, seja para compartilhar besteiras do Youtube. A tal assimetria que via naquela exposição chamada "As horas não passam para as pessoas felizes" me parece diretamente proporcional à sua persona: às vezes verborrágico, outras tantas catatônico, alguns copos com Guaraviton, outras garrafas com cerveja, assim vivemos, aprendemos, concordamos e discutimos em torno das nossas ansiedades com o teatro da arte contemporânea, dos nossos amores e das viagens por fazer.

Parece-me possível relacionar a sua produção a algumas palavras muito repetidas quando se aborda a criação contemporânea de arte - memória, autobiografia, História e escrita seriam apenas algumas delas que deveriam vir acompanhadas de citações bibliográficas e discussões conceituais mais destrinchadas. Prefiro dizer outra frase um tanto quanto cliché no que diz respeito à abordagem da arte contemporânea, mas que me parece adequada para o que conheço dele enquanto ser humano: Jonas Arrabal é um grande apaixonado pela vida.




E essa última palavra pode ser aplicada tanto ao modo como ele observa seus antepassados na sua cidade natal de Cabo Frio ou às curvas como pequenas plantas nascem a partir de um pedaço de terra colocado no chão de uma galeria. Como diz o título de um dos trabalhos mostrados aqui no Abre-Alas, a produção de Jonas tem sempre um pouco de "profilaxia", ou seja, há uma precaução, um esmero pela possibilidade de se estar vivo em si que é, porém, sempre acompanhada de uma lembrança da finitude - seja com a presença do sal grosso que com seu peso oceânico impede com que vegetais cresçam, seja a partir dos quatro lado de uma folha de papel e dos sete minutos de duração da leitura de um texto.

Da Casamata para cá muita coisa aconteceu e novas apneias ainda estão por vir. Da minha parte, acompanho e torço para que os futuros mergulhos de Jonas sigam a ser assimétricos na medida certa - irregulares na sua intensidade, do oceano atlântico à piscina de mil litros. Independentemente da profundidade dos seus saltos, que eles sigam heróicos tal qual dizia o R.E.M. em "Imitation of life": "This lightning storm, this tidal wave / this avalanche, I'm not afraid" ("Essa tempestade de relâmpagos, esta onda grande / essa avalanche, eu não estou com medo").



Que Jonas siga a "imitar a vida" através das suas imagens e que, ao contrário do que Michael Stipe diz nessa mesma música, continue a chorar perante os olhos de todos.


(texto feito para o catálogo da exposição "Abre alas 11", realizada na A Gentil Carioca, no Rio de Janeiro, entre 09 de fevereiro e 13 de março)
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