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Mancha, risco e o que está por vir

[01 de maio de 2014]




A exposição que encerra as residências de abril no Largo das Artes reúne duas artistas de localidades e propostas visuais diferentes. Magda Rachwal traz ao público uma série de experimentações que tem como estopim a apropriação de impressões fotográficas. Jogadas dentro do lixo, essas imagens foram resgatadas pela artista que se pergunta sobre o lugar de memória desses achados. Na tensão latente na relação entre aquilo que é humano e o que se transforma em passado através do registro fotográfico, há uma garantia de certeza: o esquecimento – a mesma palavra que pode ter incentivado que essas imagens fossem encontradas no espaço reservado ao dejeto. Magda, portanto, se coloca na tarefa de arranhar e recodificar essas imagens em outro sistema de significação onde a palavra se faz importante e a superfície que trazia elementos de paisagem fotografados se verte em espaço de experimentação da forma plástica. Sai o espelho da realidade, entra a potência expressiva através dos riscos e da violência sobre o papel.



Enquanto isso, Héloïse Delègue apresenta uma série de imagens que apresentam outra exploração formal. No lugar das linhas e de uma construção visual que a aproximaria da gravura, o espectador é convidado a ingressar em labirintos de cor. A dar prosseguimento às suas pesquisas com a pintura, a artista buscou formas que fossem consideradas seminais para uma cultura visual do Brasil. Após pesquisar por imagens daquilo que comumente é chamado por “arte popular”, Heloïse encontrou formas que representavam animais possíveis de serem recodificados em sua pesquisa cromática. Essas impressões de cordel são o mote das imagens apresentadas nessa exposição e não se dão aos olhos do público de modo explícito. Em verdade, não há aqui nenhuma ansiedade por se representar de modo explícito uma ideia de brasilidade, mas, por outro lado, de pensar nas formas como sua pesquisa particular sobre as relações entre mancha, cor, assimetria e recortes de formas anatômicas poderia ir de encontro a essas outras imagens bidimensionais e institucionalizadas como brasileiras.



Mas e o que está por vir? No lugar de se acomodarem no espaço da alteridade brasileira, ambas as artistas resolveram experimentar outras possibilidades da criação através da imagem no espaço da residência: Magda com um trabalho em performance com co-autoria de um grupo de participantes, Héloïse com um anseio por investigar a inserção da cor na tridimensionalidade, seja através da escultura, seja através de uma futura instalação. Pontos de partida para novas trajetórias artísticas ou apenas experimentos que ficaram ausentes de suas futuras páginas de portfolio? Ninguém sabe e não cabe se perguntar a respeito disso por agora – o importante é experimentar e deixar o tempo dessa presença no Rio de Janeiro ser decantado com calma pelas suas vidas.


(texto relativo à edição de abril da Programa de Residências no Largo das Artes, no Rio de Janeiro, que contou com a presença das artistas Magda Rachwal e Héloïse Dèlegue)
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