Raio-que-o-parta: ficções do moderno no Brasil
[07 de abril de 2022]
Esta exposição parte de um trampolim histórico – os 100 anos da Semana de Arte Moderna de 1922, realizada a poucas quadras do Sesc 24 de Maio, no Theatro Municipal de São Paulo. Como qualquer trampolim, o desejo que move esta mostra é de projetarmos nosso corpo e nossas pesquisas para o ar, nos distanciarmos deste ponto de partida e, na sequência, mergulharmos na profundidade de uma piscina de múltiplas possibilidades artísticas, curatoriais e, portanto, discursivas.
Muitas seriam as formas de sugerir narrativas para uma exposição que tem como dado primordial a distância temporal. A partir do trabalho coletivo de sete pesquisadores que atuam não apenas em diferentes regiões do Brasil, mas cujas áreas de pesquisa são complementares, uma primeira decisão foi tomada: dedicar a mostra exclusivamente à reunião de obras históricas que criaram fricções com a noção de arte moderna. Em um segundo momento, optamos por não realizar um corte severo no que diz respeito às bordas temporais da relação entre o modernismo e as artes visuais no país. Focar nos anos 1920 seria – como tantas vezes a história da arte no Brasil fez – projetar um evento pontual paulistano como farol para um país continental.
Nesse sentido, qualquer critério geográfico ou qualquer predileção por uma linguagem em detrimento de outra caminhava em uma contracorrente com os anseios da exposição. Raio-que-o-parta homenageia, em seu título, a arquitetura apelidada pejorativamente com o mesmo nome e produzida entre os anos 1950 e 1960 em Belém do Pará. Batizados por arquitetos com formação acadêmica, esses prédios – que resistem à especulação imobiliária – são exemplares de uma arte moderna no Brasil que escapa às bolsas de estudo no exterior e aos grandes nomes da aristocracia intelectual no país. Inspirando-nos em suas cores e formas fragmentadas, que indicam descontinuidade e roçam tanto na figuração quanto na abstração, desejamos que esta exposição também traga a noção de interrupção e heterogeneidade.
Os quase 200 artistas aqui reunidos convidam o público a estabelecer relações incongruentes entre desejos existenciais, anseios intelectuais e opções formais contidas em quatro núcleos ficcionais intitulados a partir de diferentes manifestações modernistas no país. Esperamos que o público – assim como a equipe curatorial e de pesquisa – aprenda especialmente sobre artistas que ainda não foram institucionalizados por uma história da arte hegemônica e que, em seu conjunto, nos levam a concluir que a arte moderna – principalmente em um país tão assimétrico quanto o Brasil – é plural, contraditória, muitas vezes incongruente e elástica.
(texto relativo à exposição “Raio-que-o-parta: ficções do moderno no Brasil”, no SESC 24 de Maio, em São Paulo, aberta entre 16 de fevereiro e 07 de agosto de 2022)