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Vamos de mãos dadas


[09 de novembro de 2018]






“O presente é tão grande, não nos afastemos /
Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas”.

Os versos de Carlos Drummond de Andrade foram publicados em 1940 e tendem a ser vistos como uma resposta a um momento tomado pela Segunda Guerra Mundial. Quase oitenta anos depois, essas palavras ainda parecem imperativas para os dias atuais. O desejo de estar junto é uma tática sócio-política que vem sendo ativada recorrentemente nos últimos dias, diante do cenário político de instabilidade. No campo artístico, ir de mãos dadas pode significar uma aposta em processos mais colaborativos e que nos exige estar abertos a coalizões, cruzamentos e intercâmbios.
 
Tomando esses versos não só como metáfora, mas também como estratégia, o Panapaná 2018 propôs o diálogo e a convivência de doze artistas da região Nordeste como possibilidade de investigação e criação artística contemporânea. Depois de cerca de um mês de diálogos à distância, foi realizada um semana de convivência entre artistas como um modo de aproximar os universos de criação e possibilitar um intercâmbio regional tendo João Pessoa como sede dessas discussões durante a exposição. Nessa semana, foram apresentadas questões de interesse central nas produções artísticas das pessoas participantes e, mais que isso, foi um momento de colaboração e intercâmbios estéticos.







De todo esse tempo de imersão virtual e física, o Panapaná resultou em uma exposição que – longe de desejar realizar um panorama da produção do Nordeste – trazia uma constelação de processos artísticos que revelam a diversidade de linguagens e anseios existenciais que podem haver dentro de apenas uma região do Brasil.

A exposição põe em tangência desde paisagens geográficas e suas relações com a memória e o corpo até pesquisas em escultura e gravura – mostradas ora como processos singulares e individuais, ora serializadas e conjuntas. Vídeo, instalação, performance e trabalhos sonoros também contribuíam no esforço em ampliar as dialogias presentes na mostra.






Somando a essa curadoria, convidamos a artista Martha Araújo (residente em Maceió, Alagoas) para mostrar algumas de suas fotografias em uma homenagem. Com uma longa pesquisa acerca das maneiras de experimentar o corpo humano por meio de diferentes materiais, enxergamos nesses trabalhos um anseio de dialogar com a alteridade que nos parece essencial para o presente. Jogar junto é, antes de qualquer coisa, um exercício de respeito às diferenças.

Através das artes, sem acepções regionalistas, a exposição contribui com outras iniciativas que sugerem retomar a necessidade de reimaginar o Nordeste não apenas como região dinâmica, criativa e pulsante, mas, sobretudo, como uma geografia que, composta por nove estados com diferentes formações e realidades, tem apontado ao resto do país como enfrentar a realidade: ninguém soltando a mão de ninguém.


(texto curatorial escrito com Tiago Sant’Ana e relativo à exposição "Vamos de mãos dadas", realizada na Galeria Archidy Picado, em João Pessoa, entre 09 de novembro e 05 de dezembro. a exposição integrava o Panapaná 2018 e contava com Adriano Machado, Cecília Urioste, Coletivo ORA [Aurora Caballero e Rafa Diniz], Cris Peres, Janderson Azevedo, João Cosme, João Oliveira, Kauam Pereira, Mariana Smith, Marília Riul, Maurício Pokémon e Virgínia Pinho)
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